Liberdade de expressão, humor e censura

Por que ditadores censuram humoristas?

O caso da decisão judicial contra o humorista brasileiro Leo Lins repercutiu na imprensa internacional. Colunista da publicação portuguesa Jornal de Notícias, Cátia Domingues questionou se decisões contra comediantes devem ser consideradas normais em países democráticos.

“É realmente grave e preocupante sabermos que há um tribunal a proibir piadas e que não é no Afeganistão”, escreveu a colunista do jornal português, ao mencionar o país asiático, que é comandado pelo grupo terrorista Talibã.

Fonte: https://revistaoeste.com/imprensa/afeganistao-censura-leo-lins-exterior/

Em um alarmante desenvolvimento, o Brasil tem sido palco de censura em múltiplas frentes, com a escalada autoritária afetando artistas, cidadãos comuns, parlamentares, lideranças políticas, movimentos civis, representantes do Judiciário, humoristas e até mesmo líderes religiosos. O silenciamento tem tomado proporções gigantescas, incluindo diversos casos de censura prévia, indo contra o que é explicitamente proibido pela Constituição.

É importante ressaltar que o governo (...) também tem adotado medidas para regular os meios de comunicação e tem sido protagonista em ações judiciais que buscam calar críticos e opositores políticos, incluindo cidadãos e parlamentares democraticamente eleitos pela população.

Diante desse cenário, o Brasil se encontra em uma encruzilhada preocupante, quase que sem retorno. A perspectiva de futuro nos próximos anos parece cada vez mais incerta, com a liberdade de expressão e os direitos fundamentais em xeque.

Fonte: https://www.conexaopolitica.com.br/politica/2023/05/17/censura-no-brasil-ja-atinge-artistas-jornais-politicos-humoristas-juristas-e-ate-lideres-religiosos/

Se há hoje no humor uma pessoa incontestavelmente provocativa é Léo Lins. A provocação não se destina apenas a seu público, mas também a grupos minorizados, alvo constante de suas piadas e, por tabela, ao Judiciário, que recebe os queixosos e os ouve. O problema é que como advogado constitucionalista, sempre tenho a fantasia de acreditar que o Judiciário, uma vez provocado, apertado contra a parede dos acontecimentos, diante das dificuldades do dia a dia, se comportará de modo democrático, não autoritário. Sempre me estrepo.

Na última semana, o Judiciário decidiu ouvir um pedido cautelar do Ministério Público do Estado de São Paulo e tascar no humorista uma série de restrições que não consigo chamar por outro nome diferente de censura.

“De antemão, ressalto que as medidas infra determinadas não se configuram como censura (…)”, diz o texto da decisão, antes de basicamente impedir o humorista de existir artisticamente. A ordem legal proíbe o humorista de manter, transmitir, publicar, divulgar, distribuir ou encaminhar, arquivos ou o que quer que seja que tenha conteúdo depreciativo ou humilhante em razão de raça, cor, etnia, religião, cultura, origem, procedência, orientação sexual ou de gênero, condição de pessoa com deficiência ou idosa, crianças, adolescentes, mulheres, ou qualquer categoria considerada como minoria ou vulnerável.

Léo Lins faz piadas com minorias? Faz. Pesadas? Sim. Ofensivas? Muitas vezes. Mas são piadas. E o Judiciário, por mais que acredite dever salvar o mundo com suas sentenças, precisa levar em conta que está submetido ao texto constitucional e proibido de censurar, por mais boa intenção que tenha. Se levarmos a ferro e fogo as imposições da decisão contra Léo Lins, qualquer humorista da atualidade teria uma gigantesca dificuldade de sustentar sua liberdade de expressão em cima de um palco. Ao buscar impedir que o humorista se manifeste no futuro, a decisão flerta com a censura prévia, vedada expressamente no julgamento da ADPF 130 pelo Supremo Tribunal Federal.

(...) As vedações impostas pela decisão são genéricas e abstratas, dão margem a que toda e qualquer coisa caiba no balaio das proibições. Diferentemente do entendido pelo Judiciário, neste caso, a liberdade de expressão não é uma concessão dada àqueles que se comportam bem; ela serve justamente para os que não se comportam poderem nos provocar, causando reflexão. Esta é a essência do humor, aliás, e de qualquer discurso artístico.

(...)

O humor é arte; a piada, ficção. O limite à arte pode ser dado pela plateia, pelo repúdio social, mas não pelo Direito.</p><p>

Não há suporte constitucional para que, em nome de louváveis valores democráticos como os que a decisão judicial procurou proteger, se impeça alguém de se manifestar e viver de sua profissão.

https://crusoe.uol.com.br/edicoes/264/leo-lins-provoca-minorias-e-o-judiciario-responde-com-censura/

Em suas próprias palavras: o que humoristas famosos disseram sobre liberdade de expressão e censura

Do massacre do jornal satírico francês Charlie Hebdo em 2015 à censura do humorista Léo Lins em 2023, a resistência sisuda e autoritária ao humor provocativo e limítrofe tem uma longa história. Os profissionais do riso, contudo, não deixam barato e continuam a oferecer resistência. Confira abaixo, nas próprias palavras deles, o que eles pensam sobre essa tensão entre liberdade e segurança psicológica.


“O problema claro em criminalizar o insulto é que coisas demais podem ser interpretadas como tal: crítica, ridicularização, sarcasmo, meramente emitir um ponto de vista alternativo à ortodoxia” – Rowan Atkinson (1955-), ninguém menos que o Mr. Bean.

“Penso que é dever do comediante encontrar onde está o limite e ultrapassá-lo deliberadamente” – George Carlin (1937-2008), rei do stand-up americano, cujo nome foi parar na Suprema Corte do país por causa de seu monólogo ‘Sete palavras que você nunca pode dizer na televisão’.

“Só porque você está ofendido, não significa que você está certo” – Ricky Gervais (1961-), britânico criador da série The Office.

“A ideia de que você precisa ser protegido de qualquer tipo de emoção desconfortável é uma ideia à qual eu definitivamente não me subscrevo” – John Cleese (1939-), britânico cofundador do grupo Monty Python.

“O assassinato é punido às vezes, a liberdade de expressão, sempre” – Mark Twain, pseudônimo do americano Samuel Clemens (1835-1910), gigante da literatura e humorista.

“Não sei se eu teria sido uma comediante de stand-up no Irã porque, como vocês sabem, o governo lá defende a liberdade de expressão... mas não tem mais liberdade depois de você se expressar. A coisa fica meio letal” – Shappi Khorsandi (1973-), nascida no Irã e naturalizada britânica.

“Hynkel, o ditador, governou a nação com mão de ferro. A liberdade foi banida, a liberdade de expressão foi suprimida e somente a voz de Hynkel era ouvida. (...) Os ditadores libertam a si mesmos, mas escravizam o povo! Lutemos para libertar o mundo” – Charlie Chaplin (1889-1977), rei da comédia do cinema mudo, no filme O Grande Ditador (1940), uma sátira contra Adolf Hitler.

“Elogiar [o SNI]? Eu não admito isso, tenha dignidade” – Dercy Gonçalves (1907-2008), uma das maiores humoristas da história do Brasil, sobre o Serviço Nacional de Informação, órgão de espionagem e censura da Ditadura Militar.

“Quem avisa, amigo é: se o governo continuar deixando que certos jornalistas falem em eleições; se o governo continuar deixando que determinados jornais façam restrições à sua política financeira; se o governo continuar deixando que alguns políticos teimem em manter suas candidaturas; se o governo continuar deixando que algumas pessoas pensem por sua própria cabeça; e, sobretudo, se o governo continuar deixando que circule esta revista, com toda sua irreverência e crítica, dentro em breve estaremos caindo numa democracia” – Millôr Fernandes (1923-2012), famoso jornalista e colunista de humor brasileiro, na última página do último número da revista O Pif-Paf, fechada em julho de 1964 pela censura da Ditadura Militar.

Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/ideias/em-suas-proprias-palavras-o-que-humoristas-famosos-disseram-sobre-liberdade-de-expressao-e-censura/

 

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